A difícil tarefa de continuar no topo

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Estratégia: Unilever já sabe que o modelo "síndrome do Omo" já não funciona mais no Brasil

 

A Unilever é uma empresa que sempre conseguiu vender seus produtos com base num raciocínio lógico e perfeitamente compreensível: ela domina 9 das 13 categorias em que atua no Brasil e seus produtos custavam mais caro porque ninguém tinha uma mercadoria com qualidade melhor do que a dela. A "síndrome do Omo", como o varejo chama a estratégia, ajudou a Unilever a vender bem mais sabão em pó Omo, maionese Hellmann's e xampu Seda, por exemplo, do que os rivais no Brasil. Mas esse modelo não tem sido capaz de dar à multinacional um crescimento vigoroso. Em 2010, as vendas no mercado brasileiro cresceram apenas 2,2%.

 

A questão é que os produtos da Unilever e os da concorrência estão com qualidade muito similar, e o fator aspiracional de uma marca, que muitas vezes decide uma compra, tem se perdido no meio a outros valores, como o da proteção ao ambiente e a responsabilidade social. O modelo da "síndrome" já não funciona mais e isso a Unilever já sabe. "Qualidade é obrigação. Hoje, as marcas têm que ter uma causa, algo que as faça descolar do resto", diz Luiz Carlos Dutra, vice-presidente de assuntos corporativos da Unilever Brasil.

 

É provável que, agora, essa clareza no posicionamento se torne fundamental para a companhia. Houve uma rápida mudança no cenário concorrencial da Unilever no Brasil, visível no último um ano e meio, e isso está pressionando os resultados da empresa em alguns segmentos em que ela liderava. O assunto foi abordado duas semanas atrás em relatório de resultados do grupo no mundo. Foi a primeira vez que voltaram a esse tema desde 2007, quando o grupo admitiu a rivalidade com marcas regionais. "O mercado brasileiro continua a crescer fortemente, mas se mostra altamente competitivo", informou o relatório.

 

Dias após publicar esses dados, a Unilever no Brasil informou que cresceu por aqui 8,1%, ao vender R$ 11,9 bilhões em produtos. Ao se considerar nesse cálculo a inflação "Unilever", espécie de reajuste médio de seus produtos, a alta real nas vendas foi de cerca de 6%. Já ao descontar a variação dos preços pelo IPCA do IBGE, de 5,9%, a expansão do grupo no Brasil é de 2,2%. Não existe aí uma base de comparação elevada - em 2009, a companhia cresceu 7,5% (nominal) e 3,2% (real) no Brasil. No ano passado, ela se expandiu menos do que a indústria de alimentos (alta de 13%) e da higiene pessoal e beleza (23,1%), dois de seus setores de atuação.

 

Por que a terceira maior empresa de consumo do mundo em vendas - só perdeu para Procter & Gamble e Nestlé em 2010 - não cresce a taxas mais altas? "Nossos resultados são positivos e satisfatórios. Somos a segunda maior operação do grupo no mundo", diz Dutra. "Ao desconsiderar o desempenho em setores mais consolidados, crescemos dois dígitos".

 

Se existissem duas Unilever, a que se destacaria seria a que atua em mercados em franca expansão ou considerados novos para ela (como xampu anticaspa e xampu bacteriano). Isso é sempre assim. Mas a empresa é uma só, e tem sido alvo de concorrência, principalmente da americana P&G.

 

Em 2010, a companhia perdeu mercado em segmentos com volumes altos. Em Seda, estava com 16,7% em dezembro, versus 8% da Pantene, da P&G. Ao final de 2009, Seda tinha 20,4%. E Pantene ganhou dois pontos em 2010. Em sabão líquido, Ariel continua a ganhar mercado de forma mais acelerada do que Omo.

 

A empresa diz que esses resultados se referem a um momento específico de mercado. "Temos um projeto com essas marcas, não estamos avaliando resultados pontuais", diz Dutra. Observa que em outras linhas como os xampus Clear, a maionese Hellmann's e o desodorante Rexona Clinical, a empresa atingiu os melhores resultados de sua história em 2010.

 

Para o professor da ESPM Ivan Pinto, ex-executivo da companhia no país, "a Unilever é o Himalaia, os concorrentes estão nos Andes". "Ou seja, ela já está num patamar que tende a crescer a uma taxa menor do que os rivais. A questão é ficar atento para que, nesse ritmo, com o passar do tempo, os concorrentes não acabem chegando perto demais do topo".

 

Pelos dados publicados pelas companhias, P&G, Kraft e a brasileira Hypermarcas se expandem mais rapidamente que a rival anglo-holandesa, a uma velocidade de dois dígitos. Na P&G, dona do Ariel, Pantene e Oral-B, concorrentes diretos da Unilever, o Valor apurou que a receita bruta teria crescido mais de 15% em 2010, com alta real de 9 % nas vendas. A empresa não comenta.

 

Na Kraft, a alta nas vendas foi de 20% na América Latina, puxado pelo crescimento no Brasil. Na Hypermarcas, ao se desconsiderar o efeito das aquisições (que poderia turbinar os números) a expansão nas vendas foi de 18% em termos nominais até setembro.

 

Enquanto a Hypermarcas lançou mais de 300 produtos em 2010, a Unilever apresentou 60 inovações, sendo que trouxe ao Brasil só uma marca inédita, a Lifebuoy. A P&G trouxe três marcas só no segundo semestre de 2010.

 

Ao se comparar a subsidiária com os resultados globais, o tom é outro. De 2005 a 2010, o grupo cresce 10% no mundo. No Brasil, 32,2%. A retração global a fez apertar os cintos e até reduzir preços para vender mais lá fora. Logo, é natural que nesse ambiente, as filiais de mercados emergentes ganhem peso.

 

Veículo: Valor Econômico


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